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A Validade das Assinaturas Digitais nos Contratos

19 de maio de 2022 publicado por Buratto Sociedade de Advogados

 

  1. Contextualizando

Com todo aquele cenário criado no começo de 2020, em razão da COVID-19 e o distanciamento imposto pelas regras de saúde púbica, as formas pelas quais mais pessoas passaram a contratar e assinarem seus contratos, sofreu uma significativa alteração.

A assinatura de contratos em plataformas digitais, deixou de ser algo restrito às empresas afeitas a novas tecnologias e chegou nas pessoas de um modo geral, indo dos contratos mais complexos, até aqueles mais simples e cotidianos, como num contrato de trabalho, ou mesmo uma prestação de serviço qualquer.

Diante disso, é normal que ainda hoje, haja questionamento sobre essa forma de contratar, se todo e qualquer contrato pode ser assinado no formato digital, ou ainda, se é válido um contrato com assinatura digital de umas das partes e de próprio punho pela outra. (*no final do texto, deixamos uma relação de plataformas de assinaturas de contratos)

Antes de chegarmos nesse ponto, é preciso conhecer o que de fato é um “contrato” afastando falsas ou incompletas premissas a respeito do tema.

2. A formação do ‘contrato’ e suas formas

Prevalece no consciente geral das pessoas, que para um negócio jurídico ser válido, deve existir um documento assinado entre as partes (alguns ainda entendem pela necessidade de reconhecimento de firma), e que sem ele, não haveria “contrato”, logo, não podendo as obrigações serem exigidas.

Porém esse pensamento, não reflete a realidade jurídica.

O direito brasileiro, optou tanto pela liberdade de contratar[1], o que significa que as pessoas são livres para contratar sobre o que, e com quem elas bem desejarem, desde que obedecidos certos requisitos mínimos, tais como o objeto ser lícito, ou que não haja proibição legal para tanto.

Ainda é preciso, mas agora para atestar validade, que haja nesse negócio jurídico a presença de 3 elementos: capacidade da parte, um objeto possível, lícito, determinado ou determinável, e ainda uma forma descrita ou não proibida pela lei, conforme dispõe o Código Civil[2].

Assim que, atendidas essas exigências as pessoas (jurídicas ou físicas) ao firmarem o negócio jurídico já assumem entre si direitos e obrigações, e, é nesse momento em que se vinculam, que surge entre elas o “contrato”. Isso se deve ao fato de que o contrato é justamente o vínculo criado entre partes que gera obrigações e deveres recíprocos. Se esse contrato será formal (escrito) ou verbal, ou ainda será no modelo digital, ou no papel mesmo, já é outra questão.

Nosso ordenamento jurídico optou pela liberdade das formas[3] que significa dizer, que não há um modelo legal a ser rigidamente obedecido para cada tipo de negociação. Somente quando a lei exigir uma certa formalidade para o negócio jurídico, é que seu não cumprimento invalidará as obrigações ali assumidas. Em outras palavras, significa dizer que, apenas quando o direito quiser que haja uma forma específica, ele o disciplinará e dirá como quer que ela seja. Exemplos desse entendimento, é a exigência para registro de propriedade na matrícula do imóvel, de que haja uma escritura pública firmada entre vendedor e comprador, ou ainda, a existência de um contrato social para se estabelecer uma sociedade empresária, ou mesmo o contrato de casamento.

Dessa forma, é que os negócios jurídicos, e por conseguinte, o contrato, podem ser realizados de diversos modos. Como cito acima, podem ser formais ou verbais, e, é justamente por isso que, mesmo um negócio firmado no “fio do bigode” tem validade, vinculando e obrigando as partes ao seu cumprimento e podendo ser exigido posteriormente.

Desde que não haja algum impedimento ou regulamentação decorrente de normas, para que o contrato seja desse ou daquele modo, as partes possuem total liberdade para definirem a forma pela qual será representado o contrato (vínculo criado), e é justamente nessa liberdade, que se assenta a possibilidade de o serem tanto no formato digital ou físico, como bem desejarem.

2.1. O documento como prova do contrato estabelecido

A questão de haver ou não um documento (digital ou físico) assinado pelas partes, que represente as obrigações firmadas, não recai sobre sua existência ou validade, mas sim, em como provar que A assumiu obrigação perante B, e quais foram as obrigações ali assumidas. Portanto, a questão de ter-se um documento assinado é de prova do contrato e não da sua validade.

Os contratos, uma vez assinado pelas partes, faz prova de que elas se vincularam, e dispensam, ao menos num primeiro momento, que haja testemunhas para atestar o vínculo criado, pois do contrário, temos a palavra de uma parte contra a outra.

A existência de um documento assinado entre as partes contratantes, busca justamente fazer prova da relação criada e seus termos. A assinatura é justamente para mitigar questionamentos sobre a declaração de vontade lançada pelas partes contratantes, por isso que afirmamos, que essa formalidade, é uma questão de prova e não de existência do contrato.

E é justamente aqui que fundamos o entendimento de que não há impedimento algum para que qualquer contrato contenha as assinaturas lançadas no formato eletrônico, de próprio punho ou misto. Até porque, mesmo os contratos representados por documentos assinados, podem e são regularmente cotidianamente questionados sob seus mais diversos aspectos, mas ao menos, o ponto de existirem já estará superado.

3. As assinaturas digitais

Vale aqui uma observação quanto as assinaturas eletrônicas. Atualmente, elas têm sido usadas em 2 formatos, aquelas assinaturas decorrentes de certificação digital ou aquelas criadas dentro do “pdf” ou plataforma de assinaturas de contratos. Em comum em ambas, temos a sua existência no formato digital e as camadas de segurança existentes no momento da sua criação.

As camadas de segurança exigidas nas assinaturas dentro de plataformas de contratos, ou dentro do ‘.pdf’ em regra se valem do uso de uma caixa de e-mail para sua criação, valendo-se do login + senha (de uso pessoal) para assegurar autenticidade.

Já aquelas assinaturas criadas a partir do certificado digital, possuem camadas adicionais de segurança, vez que para a emissão de certificado digital (chaves ICP-Brasil) é exigido além da certificadora, um conjunto de documentos e uma entrevista pessoal com o agente emissor, sendo cobrada uma taxa por certificado.

Atualmente, segundo matéria veiculada pela ANCD – Associação Nacional de Certificado Digital, com dados do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) atualmente há mais de 10.7 milhões de certificados ativos, sendo que praticamente metade deles são de empresas (5.4 mi), com um crescimento nos primeiros meses de 2022 de 11,8% em relação ao mesmo período de 2021. É certo que os certificados se prestam para uma série de outras atividades, mas é certo também que com o aumento de pessoas ‘certificadas’ a prática de assinaturas de contratos nesse modelo tende a crescer também.

Ainda mais, se considerarmos que em abril/22 o Governo Federal lançou gratuitamente o serviço de assinatura digital, disponível por meio da sua plataforma Gov.br, permitindo que as assinaturas eletrônicas sejam mais acessíveis, sem custo, bastando apenas que o interessado já esteja cadastrado na plataforma federal.

Desse modo, deve haver a ampliação do uso de assinaturas digitais, e melhor, no formato, de certificado digital (chave ICP-Brasil), vez que não haverá mais necessidade de custos para emissão do certificado. Com isso deve ser ampliado o uso das assinaturas digitais nos contratos, e é por esse motivo que é tão importante compreender que contratos digitais, assinados de forma digital, são perfeitamente válidos.

4. Conclusão

É inegável que boa parte das mudanças trazidas pela pandemia, vieram para ficar. A forma de contratar é uma delas. Cada vez mais os contratos devem surgir e permanecerem no formato digital, sem que haja qualquer necessidade de serem impressos. Até pouco tempo atrás, o procedimento comum era digital > físico > digital (criação/impressão/escaneamento), sendo que, ao que nos parece, atualmente há uma aceitação maior pelos contratos transitarem unicamente no formato digital.

 

*Relação de algumas plataformas de assinaturas digitais de contratos

[1] Código Civil:Art. 421.  A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato”

[2] Código Civil: Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I – agente capaz; II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III – forma prescrita ou não defesa em lei.

[3] Código Civil: Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.

 

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